Termos de compromisso/acordos de supervisão e a preguiça do regulador.
O
termo “preguiça” surgiu em uma animada conversa por telefone com um amigo advogado,
em uma manhã chuvosa na Cidade Maravilhosa. Depois o termo reapareceu em um
bate papo de grupo de WhatsApp que trata do tema governança corporativa.
Todos
concordam que a Instrução 607 trouxe enormes avanços a dinâmica dos processos
sancionadores. (veja a instrução em http://www.cvm.gov.br/legislacao/instrucoes/inst607.html).
Todos reconhecem (assim espero) que o pessoal da CVM realiza um trabalho hercúleo, pois
a Autarquia sobrevive com esmolas de Brasília, sem a possibilidade de repor
pessoal com um concurso, por exemplo.
E
todos sabem também que sou um crítico feroz do uso indiscriminado dos termos de
compromisso desde os tempos da internet discada e do Orkut. Sabem inclusive que
ajudei na construção do Projeto de Lei 1851/2011, que tenta restringir o uso da
ferramenta.
Dito
isto, as críticas feitas a seguir não dizem respeito somente ao colegiado atual
da CVM, liderado pelo ilustre botafoguense Marcelo Barbosa, mas a todos os
colegiados.
Vejam
o que diz o artigo 11 – parágrafos 5º e 9º da Lei 6385, que criou a ferramenta:
§ 5o A
Comissão de Valores Mobiliários, após análise de conveniência e oportunidade,
com vistas a atender ao interesse público, poderá deixar de instaurar ou
suspender, em qualquer fase que preceda a tomada da decisão de primeira
instância, o procedimento administrativo destinado à apuração de infração
prevista nas normas legais e regulamentares cujo cumprimento lhe caiba
fiscalizar, se o investigado assinar termo de compromisso no qual se obrigue
a: (Redação dada pela Lei nº
13.506, de 2017)
I - cessar a
prática de atividades ou atos considerados ilícitos pela Comissão de Valores
Mobiliários; e
II - corrigir as
irregularidades apontadas, inclusive
indenizando os prejuízos.
....
§ 9º Serão considerados, na aplicação de penalidades
previstas na lei, o arrependimento
eficaz e o arrependimento posterior ou a circunstância de qualquer pessoa, espontaneamente,
confessar ilícito ou prestar informações relativas à sua materialidade. (Incluído pela Lei nº
9.457, de 5.5.1997)
1ª
provocação: nos termos de compromisso que vemos por aí os valores pagos são
destinados integralmente para o grande cofre de Brasília. Nenhum centavo para a
indenização de prejuízos... Que tal a criação de um fundo para prejuízos
difusos?
2ª
provocação: alguma vez o parágrafo 9º da Lei 6385, que trata do acordo de
supervisão (a delação premiada no âmbito do mercado de capitais), foi usado?
Que tal usá-lo na apuração do pagamento de propina para políticos por grandes
empresas listadas, como a concessionária de rodovias sopa de letrinhas, a farmacêutica
com H maiúsculo, a companhia aérea da turma do futebol e a petroquímica com
acarajé e azeite de dendê... Ou alguém acredita que esses executivos tramaram e
colocaram de pé ardilosos esquemas de pagamento de propina sem o conhecimento dos
respectivos acionistas controladores? (ERRATA: por sugestão de um atento leitor do Blog peço considerar a leitura da Lei 13.506 sobre Acordo de Supervisão - a Lei 6.385 trata somente de circunstâncias atenuantes no momento de aplicação de penalidades)
Coloca essa turma numa salinha e “oferece”
para negociação uma multa de R$ 50 milhões e inabilitação de 20 anos por CPF
que esses executivos abrem o bico rapidinho. Uma coisa é o acerto do executivo
com o MP/justiça criminal, outra coisa é o delito no âmbito do mercado de
capitais.
Abraços
fraternos,
Renato Chaves
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