Instrução CVM 607: apertando o cerco contra crimes do colarinho branco.
A tão esperada Instrução
que trata da apuração de infrações administrativas, o rito dos processos
administrativos sancionadores, a aplicação de penalidades, o termo de
compromisso e o acordo administrativo em processo de supervisão no âmbito da CVM,
sob a ótica da Lei 13.506, foi publicada e vale a partir de 1º de setembro
(leia mais em http://www.cvm.gov.br/noticias/arquivos/2019/20190625-1.html),
para agonia dos criminosos que atuam no nosso combalido mercado de capitais.
Bem estruturada, a
Instrução trata de circunstâncias agravantes de forma cirúrgica no art. 65:
sabem aquele meliante que pratica insider
trading usando o CPF da mãe? Pois é, o tamanho da “borduna” vai aumentar,
já que o crime se deu com “o cometimento de infração mediante ardil, fraude ou
simulação”.
E aquele executivo, paramentado
de caneta Mont Blanc e relógio TAG Heuer, que usa o cargo que ocupa para obter
ganhos ou minimizar perdas negociando ações com informações privilegiadas? Também
vai “ganhar” um agravante nas costas, pois a nova regra considera “a violação
de deveres fiduciários decorrentes do cargo, posição ou função que ocupa”.
Uma novidade que merece
atenção é a figura do “acordo administrativo em processo de supervisão (“Acordo
de Supervisão”), para pessoas naturais ou jurídicas que confessarem a prática
de infração às normas legais ou regulamentares, com extinção de sua ação
punitiva ou redução de 1/3 a 2/3 da penalidade aplicável, mediante efetiva,
plena e permanente cooperação para a apuração dos fatos, da qual resulte
utilidade para o processo... Ideal para casos de pessoas (nenhuma empresa é
corruptora, quem assina o “cheque” é um CPF/administrador) que usam empresas listadas
para a realização de pagamentos indevidos a agentes públicas, como empresa que voa
com a seleção de futebol e a petroquímica baiana. Detalhe: está prevista a
extinção da ação punitiva da administração pública, na hipótese em que a
proposta do Acordo de Supervisão tiver sido apresentada sem que a CVM tivesse
conhecimento prévio da infração noticiada. Acordo de supervisão ou acordo de
saliência? Ficha limpa para o meliante se confessar o crime antes do xerife
ficar sabendo pelo jornal Valor. O mercado nunca vai saber da prática criminosa?
Como fica a tão apregoada transparência?
Mas talvez a grande (e
boa) novidade para o mercado seja o artigo 85, que trata da reparação de danos
a investidores: “na hipótese de serem detectados danos a investidores e a fim
de instruir a análise da proposta, a CVM poderá, a seu critério, notificá-los
para que forneçam informações quanto à extensão dos prejuízos que tiverem
suportado e ao valor da reparação”. Golaço da CVM.
Tendo participado da
audiência pública como um nano investidor pessoa física, entre tantos ilustres
advogados e importantes associações, como AMEC, Anbima, Ibracon, IBRI e IBGC (veja
o relatório completo em http://www.cvm.gov.br/audiencias_publicas/ap_sdm/2018/sdm0218.html),
tentei sensibilizar a autarquia a subir a régua de punições (o famoso grupo V
do anexo 63), mas não obtive sucesso. Mas como dizem meus amigos gaúchos, “não
tá morto quem peleia”.
Por fim, fiquei com uma
pulga atrás da orelha (bem pequena que não prejudica o conjunto da obra), pois
o artigo 49, que trata do julgamento em sessão pública, prevê a possibilidade
de restringir o acesso de terceiros em função do interesse público. Como
assim? O interesse público no mercado de capitais, que capta recursos da
chamada poupança popular, não deve ser sempre a transparência ampla, geral e
irrestrita?
Abraços a todos,
Renato Chaves
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