Definição de acionista controlador: conceitos confusos na regulação e criatividade jurídica geram insegurança.
Sempre que a condição de
acionista controlador traz obrigações financeiras a reboque, como a
obrigatoriedade de promover Oferta Pública de Aquisição por alienação de
controle, ou dúvidas sobre o exercício do voto, como em votações para a
aprovação de contratos entre partes relacionadas, surgem interpretações criativas,
verdadeiras licenças poéticas na leitura das leis.
Quem não se lembra do caso
Arcelor-Mittal, nos idos de 2006, que resultou em uma OPA mandatória de US$ 5
bilhões? O biliardário indiano tentou emplacar um conceito esotérico de “fusão
entre iguais” para fugir da obrigação de realizar uma OPA no Brasil, mas o
nosso xerife não caiu na historinha. Palmas para a CVM. (relembre o caso lendo
a matéria da Revista Capital Aberto em https://capitalaberto.com.br/edicoes/bimestral/edicao-37/aquisicao-de-controle-da-arcelor-confere-tag-along-aos-minoritarios/#.W0-ZRtJKiUk
).
Já escaldados, criativos
controladores e seus caríssimos assessores (bancos de investimentos e
advogados) conseguiram emplacar o controverso conceito de “reforço de controle”:
foi em 2007, no caso que o Colegiado entendeu que a alienação de participação
entre integrantes do bloco de controle da Copesul (Ipiranga e Braskem) não
constituiu alienação de controle, para os efeitos do art. 254-A da Lei das S.A.
Ou seja, pela manhã o minoritário enxergava DOIS acionistas no bloco de
controle, no final da noite passou a enxergar somente UM acionista, mas nada
mudou (mais detalhes no link http://www.cvm.gov.br/export/sites/cvm/decisoes/anexos/0004/5533-0.pdf).
Procurem um oftalmologista, pois deve ter sido uma ilusão de ótica rs. Ou
melhor, ilusão idiótica. Lição para os dias de hoje, pois certa empresa de
maquininhas controlada por bancos pode ser a próxima a aproveitar essa leitura
poética da Lei.
Agora, pasmem queridos
leitores, foi criada a figura do “quase controlador”. O julgamento do processo
CVM SEI 19957.009575/2017-73 é um daqueles que merece estudos acadêmicos. Dá nó
na cabeça de investidor não-advogado (disponível em http://www.cvm.gov.br/export/sites/cvm/decisoes/anexos/2018/20180904/0975__Voto_DPR.pdf).
A empresa envolvida, Wiz
Soluções e Corretagem de Seguros S.A., é listada no Novo Mercado e atua no
segmento de corretagem, intermediação de negócios e administração de bens,
envolvendo produtos e serviços oferecidos pela Caixa Econômica Federal e suas
parceiras. Ao avaliar quem seriam os acionistas controladores indiretos da Cia
os membros do colegiado da CVM, reformando uma decisão da SEP, inventaram uma
nova classificação: o acionista relevante com influência significativa.
Sim meus nobres leitores, a
Caixa Seguridade, um acionista com 48,21% da controladora da Wiz (a Caixa
Seguros Holding S.A. - CSH), repleta de direitos garantidos em cláusulas que
estabelecem quóruns qualificados, não foi considerada controladora indireta,
mas sim um mero “acionista relevante com influência significativa”. Um
prato cheio para quem quer mandar na companhia, mas não ser nunca responsabilizado
em processos de abuso de controle.
Mais estranho é que isso
acontece quase que concomitantemente ao julgamento do Fibria-Suzano (uma
operação pra lá de criativa), uma vez que o relatório usado para suportar a
decisão no caso menciona, a título de exemplo, que um acionista “todo poderoso”
controlava a cia. listada Totvs com “apenas” 20,06% do capital social !!! (vide
pg. 33 em http://www.cvm.gov.br/export/sites/cvm/decisoes/anexos/2018/20180904/1150__Memorando_176_GEA4.pdf).
Veio-me à lembrança aquela
música que tocava nas rádios nos anos 80: mãe eu acho que estou ligeiramente
grávida.
Estou quase convencido que
os nossos advogados estão usando meias amarelas com sapatos sociais tamanha a
criatividade aplicada em casos do gênero, só comparável à do pessoal dos
departamentos de marketing das empresas de telefonia.
Abraços a todos,
Renato Chaves
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