O holofote nas remunerações está mais forte do que nunca.
A matéria publicada no jornal Valor do dia 04/5, com o título “Arrocho Salarial”, revela que os investidores, especialmente os estrangeiros, estão mais atentos à questão de remuneração de administradores nas empresas brasileiras. Apesar do completo obscurantismo que envolve as atas de assembleias no Brasil (todas redigidas e divulgadas na forma de sumário e geralmente sem a lista de acionistas presentes), é possível concluir que aumentou o número de assembleias onde acionistas descontentes votaram contra as propostas de remuneração apresentadas. E no caso da PDG Realty S/A, empresa do ramo imobiliário com controle acionário difuso e listada no Novo Mercado, 60% dos acionistas presentes à assembleia votaram contra a proposta de verba global dos administradores – uma situação única no mercado de capitais brasileiro.
Nesse contexto duas situações chamam a atenção: a 1ª relacionada com a falta de transparência, pois algumas empresas insistem em negar a divulgação das informações sobre as remunerações mínimas, médias e máximas dos administradores (no formato exigido pela Instrução CVM 480), “protegidos” por uma famigerada liminar (já cassada pelo TRF da 2ª Região mas ainda “vítima de embargos declaratórios”); a 2ª situação diz respeito às discrepâncias encontradas nos modelos de remuneração, ora por conta da forte concentração das remunerações em honorários fixos, ora pela falta de relação dos polpudos bônus anuais com sistemas de metas de performance. Ainda temos os casos de remunerações máximas completamente descoladas das remunerações médias/mínimas, especialmente em conselhos de administração. Os questionamentos a seguir, formulados a partir de formulários de referência com dados de 2009, são uma pequena amostra dessas aberrações:
- Faz sentido um presidente de conselho de administração receber mais de R$ 3,8 milhões/ano enquanto que o CEO dessa Cia., líder de uma numerosa diretoria, recebe “somente” R$ 3,1 milhões/ano?
- Parece razoável um presidente de conselho de administração receber mais de R$ 2,9 milhões/ano enquanto que um colega do mesmo Conselho recebe pouco mais de R$ 200 mil? Será que foi criada uma categoria de sub-conselheiros, com direitos e obrigações diferenciadas, sem que o mercado tenha tomado conhecimento? Ou será que o mercado reconhece que o controlador que ocupa a presidência do conselho de administração merece um dividendo turbinado e diferenciado, disfarçado de honorário de conselheiro?
- E o que pensar de diferenças de remuneração entre conselheiros fiscais, onde a menor remuneração é de pouco mais de R$ 100 mil enquanto que a maior remuneração ultrapassa R$ 330 mil? Será que um fiscaliza mais do que o outro? Sem falar nas empresas que não cumprem a exigência legal, aplicando uma remuneração para os conselheiros fiscais inferior a 10% do salário fixo médio da diretoria.
Uma observação importante: conversas com renomados consultores em seleção de executivos (os chamados head hunters) revelam que a remuneração razoável para um conselheiro de administração experiente está na faixa de R$ 30 mil/mês (reais !!! Nada de dólares ou euros). Esse seria um valor considerado justo, condizente com o grau de responsabilidade de um conselheiro, mas que por outro lado não cria uma dependência financeira que possa ferir a independência na atuação; essa lógica ganha mais sentido quando consideramos que os candidatos naturais para essas posições são executivos (ou ex) que já conseguiram formar um patrimônio que lhes permitem abrir mão da posição a qualquer tempo, caso se sintam aviltados em sua liberdade de pensamento.
Os investidores estrangeiros já acordaram; só faltam os investidores institucionais nacionais se posicionarem.
Bom artigo, Renato! Obrigado.
ResponderExcluirCaro Renato, excelente artigo, e concordo 100% com vc, como existem algumas alegações (algumas sureais) de alguns executivos gostaria da sua opinião sobre:
ResponderExcluir- Ter o conhecimento da remuneração dos executivos não agrega nenhum valor aos acionistas
- Coloca em risco o principal executivo que poderá ser alvo de sequestro
- Poderão ocorrer tumultos e greves, pois os sindicados dos trabalhadores não tem noção da importancia de se remunerar bem os executivos
- As empresas de capital aberto irão perder os melhores executivos para as empresas Ltda.
- Já existe fiscalização basstante da auditoria, comite de auditoria, conselho fiscal ..., que saberia informar a AGO se houvesse abussos na remuneração.
Roberto Gonzalez
Prezado Roberto,
ResponderExcluirAs suas questões são ótimas. Vamos lá:
1)Ter o conhecimento da remuneração dos executivos não agrega nenhum valor aos acionistas
R: o que os acionistas desejam saber é se a política de remuneração foi construída para alinhar os interesses de executivos e investidores. Isso porque pacotes de remuneração agressivos em bônus de CP e ações já foram responsáveis por inúmeros casos de destruição de valor em grandes corporações. Se as métricas de avaliação são construídas com foco no crescimento do EBITDA, por exemplo, corre-se o risco de remunerar os administradores por algo que não se sustenta no médio/longo prazo (ex: economia nos gastos com o tratamento de lixo tóxico industrial que gera aumento imediato no EBTIDA e um passivo futuro de difícil mensuração). Resumindo, quando aprova uma verba global o investidor não têm a certeza de que a empresa está remunerando as pessoas certas, visando estimulá-las a criar valor para a corporação, de forma perene;
2)Coloca em risco o principal executivo que poderá ser alvo de seqüestro
R: o risco para um executivo já existe por conta da própria estrutura da nossa sociedade. Infelizmente, quem possui um Porsche Cayenne 2011 na garagem, uma casa de praia em Angra com uma bela Phoenix 275 Platinum no ancoradouro e viaja pelo menos uma vez por ano para o exterior já corre algum risco. Mas os casos apresentados pela mídia revelam que os sequestradores quase sempre são pessoas “relacionadas” com os sequestrados - são empregados insatisfeitos ou ex-empregados, conhecedores das rotinas das vítimas. Ou ainda empregados merecedores de total confiança, mas que são ameaçados e obrigados a informar a rotina da vítima para um vizinho bandidão. Mas, se mesmo assim imaginarmos que um sequestrador profissional irá se valer da leitura de jornais para escolher a sua vitima, o modelo que vigorava antes da instrução CVM 480 (divulgação somente da verba global aprovada na assembléia) já lhe serviria. Bastava dividir a verba global pelo número de administradores. Exemplificando: se a ata da assembléia informa que a verba global aprovada foi de R$ 20 milhões e que foram eleitos 5 diretores e 5 conselheiros, a conta simplória é que cada um ganhará R$ 2 milhões no ano. Não importa se um deles ganhará R$ 1,950 MM e o outro ganhará R$ 2,050 MM. Resumo da prosa... a conta, apesar de imprecisa, permitiria concluir que todos os diretores são milionários - ninguém recebe R$ 2 mil por mês.
3)Poderão ocorrer tumultos e greves, pois os sindicados dos trabalhadores não tem noção da importância de se remunerar bem os executivos R: pela mesma razão apresentada anteriormente avalio que esse risco não existe. A verba global já é conhecida e permite que qualquer pessoa faça uma conta muito próxima da realidade. E todos sabem que diretor é diretor, gerente é gerente, supervisor é supervisor e peão é peão;
4)As empresas de capital aberto irão perder os melhores executivos para as empresas Ltda.
R: penso que esse risco já existe, pois as empresas especializadas em pesquisa salarial conseguem mapear com muita competência tanto as remunerações de executivos empresas de capital aberto como de Ltdas;
5)Já existe fiscalização bastante da auditoria, comitê de auditoria, conselho fiscal ..., que saberia informar a AGO se houvesse abusos na remuneração
R: quando o acionista aprova uma verba global ele está passando um cheque em branco, não existindo nada de ilegal na distribuição feita pelo conselho de administração. Conhecer a política e opinar sobre ela permite ao investidor buscar o alinhamento de interesses tão desejado.
Um forte abraço,
Renato Chaves.