Os prêmios de Governança Corporativa e e a confusão no Prêmio Jabuti de literatura

A grande confusão que observamos no meio literário, tão bem retratada no texto de Luiz Schwarcz (“Quem garfou Edney Silvestre? Ou como se discute um prêmio literário no Brasil” publicado na Folha de SP de 21/10), nos leva a uma reflexão sobre os diversos prêmios do mercado de capitais que buscam reconhecer as boas práticas de governança corporativa, com ênfase para a transparência.

A triste constatação, após uma análise detalhada dos resultados de 4 dos mais tradicionais prêmios, patrocinados pelo IBGC (6ª edição do Prêmio de Governança), Abrasca (12º Prêmio Relatório Anual), ANEFAC/Fipecafi/Serasa (XIV Troféu Transparência) e Revista Capital Aberto (3ª edição das Melhores companhias para os acionistas), é que, com exceção da premiação do IBGC, todos os outros prêmios classificaram empresas que não cumprem integralmente a Instrução CVM nº 480 (especificamente o item 13.11 do Formulário de Referência que trata de remuneração de administradores). São empresas que, amparadas por uma decisão liminar proposta por uma entidade afastada dos debates sobre boas práticas de governança corporativa (prova disso é o completo silêncio no período de audiência pública), afrontam a CVM ao colocar em dúvida a autoridade da autarquia em regular a forma de apresentação de informações para os investidores. Vale registrar que a liminar já foi “derrubada”, mas ainda é utilizada por algumas poucas empresas por força de instrumentos jurídicos protelatórios.

No caso do Prêmio Abrasca nada menos do que 3 empresas entre as 8 melhores classificadas se escondem atrás da “falecida” liminar. Já no Troféu Transparência (ANEFAC/Fipecafi/Serasa) a situação é um pouco pior: metade das 10 “melhores” empresas continua escondendo dos seus investidores as informações previstas na regra da CVM.

O caso da premiação da Revista Capital Aberto merece uma análise mais detalhada uma vez que a metodologia empregada considera a questão da divulgação da remuneração. Porém, o fato da empresa utilizar a tal liminar não traz prejuízo na pontuação final; é somente uma questão a mais entre tantas outras espalhadas nos 5 grupos de questões que norteiam a classificação final (liquidez, criação de valor, retorno para o acionista, governança corporativa e sustentabilidade).

Passada a fase de contestação com o argumento da segurança (agora restrita às entrevistas coletivas de um certo técnico de futebol que fica verde de raiva toda vez que um jornalista toca no assunto....), os números de remunerações já divulgados revelam algumas discrepâncias, como absurdas diferenças entre as remunerações mínimas e máximas, tanto nas diretorias quanto nos conselhos de administração, além de um peso excessivo na remuneração variável de curto prazo de administradores (algumas acima de 85% da remuneração total), sem que fique provado o alinhamento da política de remuneração com os objetivos estratégicos de longo prazo das companhias.

Palmas para o IBGC e para as empresas agraciadas pelo Instituto: Fleury (categoria empresas listadas), SulAmérica (categoria inovação) e Eternit (categoria evolução). E vida longa para as boas práticas de governança corporativa, mas com transparência sempre.

Comentários

  1. Mais uma vez o Renato toca em um ponto sensível:premiações não aderentes à realidade.
    E, depois, criticam a governança do Panamericano.
    Acredito que o exemplo vem de cima. É como o caso da ficha limpa da política: como é que um condenado se inscreve em um partido ?
    A pergunta que devemos fazer aos organizadores e patrocinadores dos prêmos: por que vocês não criam uma "ficha limpa" de quem pode participar ?
    Eu tenho uma possível respostas: sobram poucos !

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  2. Renato, a divulgação (ou a não divulgação) da remuneração dos executivos é realmente um tema polêmico! A publicidade da remuneração de altos executivos pretendida pela CVM traz para a cultura brasileira uma prática de mercados nos quais não existe um gap considerável entre aos valores da remuneração praticada por uma empresa. Não é prática comum, no Brasil, que um cidadão comum fale abertamente sobre o valor da sua remuneração com os colegas de trabalho e amigos. Enfim, a divulgação da remuneração, para nós brasileiros, ainda requer uma quebra de paradigma. É verdade que companhias de capital aberto devem dar transparência a informações importantes para a decisão dos investidores, mas também é verdade que definir o valor da remuneração individual de diretores é uma atribuição do Conselho de Administração, que possui todas as obrigações legais que tão bem conhecemos. As empresas que possuem Conselho de Administração, comitê de remuneração, planos de metas para atribuir remuneração variável e se baseiam em consultorias especializadas para fixar os valores da remuneração fixa que serão propostos à Assembleia praticam boa governança. Divulgar ao mercado o valor da remuneração é uma das etapas da transparência, mas não é a única. Por isso, ao considerarmos que as empresas que ainda não divulgam a remuneração do Diretor Presidente - que é a maior remuneração -, mas que divulgam os processos internos que utilizam para propor a remuneração dos seus administradores, não são merecedoras de prêmios de governança seria reduzir a governança corporativa a uma única prática, ignorando tantas outras que são muito importantes para um sistema de governança eficiente.

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  3. Sobre o comentário acima: realmente algumas empresas que usaram a liminar divulgam os processos internos que utilizam para propor a remuneração de executivos. O que me leva a questionar a premiação dessas empresas não é o fato em si (não divulgação das remunerações no formato da CVM) mas a utilização de um artifício (ação judicial por intermédio de uma entidade não relacionada com o mercado) para afrontar o regulador, colocando em xeque a capacidade de atuação da CVM. E viva o nosso querido Chico Buarque.

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